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O resultado de uma pesquisa publicada em 2016 na revista British Journal of Dermatology (BJD) levantou a hipótese de uma possível relação entre o uso de cremes faciais e a frequência cada vez maior de alopecia frontal fibrosante (AFF), principalmente em mulheres.

Os dados contidos no artigo publicado no periódico inglês instigaram a dermatologista Drª. Aline Donati a pesquisar mais sobre o assunto, levando a especialista a realizar um ‘Estudo da prevalência de alopecia frontal fibrosante nos dermatologistas brasileiros’.

“A maioria dos dermatologistas são do gênero feminino e tem como perfil o uso de inúmeros produtos cosméticos. O objetivo deste estudo é determinar a prevalência de alopecia frontal fibrosante nos dermatologistas brasileiros, que são uma população com elevada frequência de exposição a cosméticos faciais”, relata Drª. Aline Donati.

Na entrevista abaixo a dermatologista dá mais detalhes sobre a sua pesquisa. Acompanhe.

1. O que é alopecia frontal fibrosante?

É um tipo de alopecia cicatricial que acomete quase exclusivamente mulheres adultas e leva a perda dos cabelos da borda anterior do couro cabeludo e das sobrancelhas. Além do acometimento folicular, a doença pode levar a alterações de pele como discromias, pápulas na face, eritema tipo rosácea e atrofia cutânea que acometem principalmente as áreas foto-expostas. Foi descrita inicialmente em 1994 e sua incidência vem aumentando em todo o mundo.

2. Por que estudar alopecia frontal fibrosante?

Porque é uma doença que está afetando um número cada vez maior de mulheres e levando a um acometimento inestético importante com consequente perda da qualidade de vida. Por se tratar de uma doença cicatricial, a perda capilar é irreversível e os tratamentos disponíveis conseguem apenas impedir a piora, mas não recuperam as alterações já estabelecidas. Precisamos estudar a doença para poder preveni-la no futuro e assim evitar o acometimento de muitas mulheres.

3. Quais os indícios que levam a crer que um fator ambiental ainda desconhecido pode estar associado ao desenvolvimento da AFF?

O surgimento recente da doença e o rápido aumento de sua prevalência sugerem que possa haver um fator externo envolvido no desencadeamento do processo inflamatório auto-imune. Além disso, o acometimento preferencial da porção superior da face e borda do couro cabeludo e a preponderância do acometimento do gênero feminino apontam para um possível agente de uso tópico pelo público feminino.

4. O que levou a doutora a realizar este estudo?

No último ano foram publicados artigos que sugerem uma associação entre AFF e o uso de cosméticos faciais, incluindo o protetor solar. Estas publicações geraram uma grande polêmica pois, embora não confirmem, podem indicar uma relação causal. Caso isso venha a ser confirmado, o impacto na dermatologia será enorme, não apenas porque são os dermatologistas que prescrevem muitos desses cosméticos, mas também porque as próprias dermatologistas são grandes usuárias de cosméticos.

5. E por que escolheu como público pesquisado médicos dermatologistas?

AFF já é comprovadamente o tipo de alopecia cicatricial mais frequente em muitas regiões do mundo, mas não existem dados sobre a prevalência exata da doença na população geral e ela ainda é considerada uma doença rara. A idéia de estudar a prevalência da doença nos dermatologistas veio do fato de que a maioria são mulheres com hábito de uso de cosméticos. Caso seja real a associação entre AFF e cosméticos, é provável que a prevalência da doença seja maior neste grupo.

6. Como será a avaliação da frequência da AFF e do uso de cosméticos nos dermatologistas brasileiros?

Este será um estudo transversal realizado através de um questionário online. As dermatologistas receberão um email convidando a participar da pesquisa e aquelas que aceitarem serão redirecionadas para um site onde deverão responder a algumas perguntas sobre a presença ou não da doença e de fatores possivelmente associados com a doença, como o uso de cosméticos. É muito importante que o máximo de colegas participem desta pesquisa para que possamos descobrir qual a real incidência de AFF entre as dermatologistas. Todas as informações serão mantidas em sigilo e a participante será identificada apenas por um código gerado em seu acesso inicial.

7. O objetivo do seu estudo é determinar a prevalência de AFF nos dermatologistas brasileiros, que são uma população com elevada frequência de exposição a cosméticos faciais. Após o resultado final, o que poderá ser feito para reverter ou amenizar a AFF no futuro?

A prevalência de AFF em dermatologistas será um dado importante para corroborar a associação entre o uso de cosméticos e AFF. Entretanto, não será decisiva para confirmar a associação como sendo causal. Nossa ideia é fazer este estudo de prevalência inicialmente e depois seguir as dermatologistas que aceitarem em um estudo de coorte ao longo de 10 anos. Com este desenho de pesquisa prospectivo pode-se falar mais claramente em associação causal. E se chegarmos à conclusão ao final desses estudos de que os cosméticos estão de fato envolvidos na etiologia da doença, o próximo passo será descobrir qual substância química exata para bani-la do mercado.

8. Quanto tempo este estudo levará para ser finalizado?

O estudo de prevalência deve ocorrer durante um ano. Após este período, aqueles que concordarem em participar da coorte serão contatados anualmente durante 10 anos.

Fonte: SBCD